BBom não tem todos os rastreadores negociados, suspeita MP
Em coletiva, procuradora questionou quantidade informada de aparelhos.
Justiça suspendeu atividades da empresa por suspeita de pirâmide financeira.
Promotor Murilo Miranda e procuradora Mariane Guimarães durante coletiva (Foto: Gabriela Lima/G1)
Os Ministérios Público Federal e Estadual de Goiás suspeitam que o grupo
BBom
não tenha todos os rastreadores oferecidos aos associados. Em
entrevista coletiva nesta quinta-feira (18), a procuradora da República
Mariane Guimarães e o promotor Murilo Miranda apontaram esse como mais
um indício de formação de pirâmide
financeira, prática ilegal no país.
Por decisão judicial, a
BBom teve as atividades suspensas e os bens bloqueados.
Durante a coletiva, a procuradora e o promotor não souberam informar a
quantidade exata de associados ou de rastreadores oferecidos mediante
taxa de adesão e pagamento de mensalidade por um prazo determinado. A
procuradora Mariane Guimarães disse ter constatado no site Reclame Aqui
mais de 1.200 reclamações de associados que nunca receberam os
rastreadores.
Outro ponto destacado pelos MPs é o fato da empresa não ter informado a
quantidade exata de rastreadores negociados em comodato.
"Estranhamente, ela só informa nos autos uma amostragem, que seria de 14
mil equipamentos negociados. Também demonstra ter adquirido 70 mil
aparelhos para vendas futuras", diz Guimarães.
"Nós acreditamos que a empresa que fornece esses rastreadores não tem
condição de fornecer os aparelhos que a BBom precisaria ter para atender
a quantidade estratosférica de consumidores para os quais ela vendeu",
avaliou.
Por meio de nota enviada por sua assessoria de comunicação, a BBom informou ao
G1
que comprou 1.250.000 rastreadores, sendo que 30 mil já foram
entregues, 75 mil estão em estoque, 145 mil, em trânsito, e 1 milhão de
aparelhos serão entregues seguindo a previsão de entrega dos
fornecedores.
“Estamos seguindo uma programação de entrega de acordo com a data de
solicitação do rastreador pelo associado. Em até 60 dias todas as
solicitações serão atendidas, conforme o cronograma de solicitação”, diz
a nota.
'Dinheiro fácil'
Os MPs estimam que o grupo tenha mais de 1.500 associados. "Muitos
deles possuem várias cotas", explica Murilo Miranda. Por isso, acreditam
que o número informado é insuficiente para atender todos os clientes.
Para a procuradora, o consumidor muitas vezes entra sem ter um interesse real no produto e querem apenas "ganhar
dinheiro fácil
e rápido com o aliciamento de novos operadores". Guimarães explica que o
valor cobrado por comodato, de R$ 80, não é competitivo. "Esse valor é
altíssimo. Nós apuramos que várias empresas que vendem esses
rastreadores praticam preços bem mais razoáveis, que varia de R$ 30 a R$
50 de aluguel", afirma.
A procuradoradora e o promotor reafirmaram que, como em outros casos
emblemáticos de pirâmide financeira, o rastreador oferecido pela BBom
seria apenas uma “isca” para recrutar novos associados, como ocorreu com
a “Avestruz Master”.
Procuradora Mariane Guimarães questiona dado
parcial de equipamentos (Foto: Gabriela Lima/G1)
Lucro de 3.000%
Chamou a atenção de procuradores e promotores o patrimônio dos sócios
proprietários da empresa e crescimento exponencial dos lucros da BBom em
um curto espaço de tempo. "O rastreador não é um produto popular para
ter um apelo comercial que justifique um aumento de lucro de 3.000% em
um espaço de três meses.
Sem divulgar o valor do patrimônio dos sócios proprietários do grupo, a
procuradora destacou que é uma "quantia preocupante". O dado, segundo o
promotor Murilo Miranda, não pode ser divulgado por determinação
judicial.
Para Mariane Guimarães, esses pontos reforçam a tese da prática de
pirâmide financeira. "Diferente de uma empresa de marketing multinível
séria, o foco principal dela não é a venda do produto, e sim o
recrutamento de novos divulgadores, para que esses novos divulgadores,
num esquema piramidal,
ganhe dinheiro recrutando mais e mais", argumenta.
A suspeita da prática de pirâmide financeira levou os ministérios
públicos estaduais e federais de 20 estados a organizarem uma
força-tarefa para combater a prática ilegal no país.
Bloqueio de bens
"Nós, num primeiro momento, solicitamos o bloqueio de todas as contas,
bens móveis e imóveis desse grupo, para resguardar um dinheiro que a
gente pensa, no final da ação, em devolver para os consumidores que
forem lesados. Num segundo momento, solicitamos que a empresa fosse
impedida de fazer novos associados, para evitar que novos consumidores
venham a ser lesados", argumenta a procuradora.
Os pedidos foram acatados pela juíza federal substituta da 4ª Vara
Federal de Goiânia, Luciana Laurenti Gheller. No dia 10 de julho, ela
determinado a indisponibilidade dos bens da empresa e de seus sócios por
"robustos indícios" de pirâmide financeira. Estão bloqueados R$ 300
milhões em contas bancárias do grupo, além de cerca de 100 veículos,
incluindo motos e carros de luxo como Ferrari e Lamborghinis.
Em uma segunda liminar, na quarta-feira (17), a juíza determinou a
"imediata suspensão" das atividades desenvolvidas pela empresa
Embrasystem, conhecida pelos nomes fantasia BBom e Unepxmil, e proíbe o
cadastro de novos associados bem como a captação de recursos financeiros
junto aos associados que já integram a rede, "incluindo a percepção das
mensalidades cobradas". A decisão é provisória e ainda cabendo
recurso.
Em nota divulgada na quarta-feira (17), a BBom informou que "está
tomando as providências judiciais cabíveis para retirar todo e qualquer
impedimento às suas atividades" e diz estar "à disposição das
autoridades para prestar os esclarecimentos que forem solicitados". A
BBom sempre negou irregularidades ou a prática de pirâmide e se
identifica como "empresa especializada em canal de vendas direta e
marketing multinível".
Marketing multinível
Na decisão, a juíza federal destacou também as diferenças entre o
modelo de negócios denominado “marketing multinível” ou “marketing de
rede”, e o golpe conhecido por “pirâmide financeira”.
No marketing multinível, o faturamento é calculado sobre as vendas dos
produtos e a venda do produto é a base de sustentabilidade do negócio,
destacou a juíza. Já no esquema de pirâmide, os participantes são
remunerados somente pela indicação de outros indivíduos para o sistema,
sem levar em consideração a real geração de vendas de produtos, o que
acaba por tornar o negócio insustentável, uma vez que é matematicamente
impossível atrair novos participantes para uma rede que se funda
unicamente nos pagamentos realizados pelos associados.
Pelo modelo da BBom, os interessados se associam mediante o pagamento
de uma taxa de adesão, que varia de R$ 600 a R$ 3 mil, de acordo com o
plano escolhido. Depois disso, a pessoa se compromete a atrair novos
associados e a pagar uma taxa mensal no valor de R$ 80, pelo prazo de 36
meses, segundo a investigação do MP. Quanto mais participantes o
associado consegue trazer para a rede, maior é a premiação prometida.
"Este tipo de esquema é coisa antiga. Mas com as redes sociais ganhou
um fermento potencial inimaginável. Hoje, estas empresas crescem de
maneira rápida demais e aprendemos que quanto antes se consegue intervir
e bloquear menor o prejuízo para as vítimas", destacou a procuradora.
g1 informações