'Muito chateada', diz mulher obrigada pela Justiça a fazer cesariana no RS
Adelir Góes, de 29 anos, reclama de hospital e da decisão judicial.
Promotor diz que parto normal colocava em risco a vida da mãe e do bebê.
Uma mulher de 29 anos que foi submetida a uma cesariana contra a
própria vontade, por determinação da Justiça do Rio Grande do Sul,
desabafou contra o atendimento médico recebido no hospital e a decisão
judicial. Em vídeo gravado pelo marido
(veja ao lado) ainda
no hospital, Adelir Carmen de Goés diz que se sentiu "frustrada" e
"chateada" após o parto da filha, Yuja. A paciente deve receber alta
nesta quinta-feira (3).
O caso ocorreu na segunda-feira (31) no hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em
Torres,
no Litoral Norte gaúcho. A gestante queria que o bebê nascesse de parto
normal, mas a equipe médica entendeu que o procedimento colocaria em
risco a vida dela e do bebê.
Após voltar para casa, contrariando a orientação médica, a mulher foi
reconduzida ao hospital por um oficial de Justiça, escoltada por
policiais, em cumprimento de uma ordem judicial. Na madrugada de
terça-feira (1°), Adelir deu à luz sua filha, que nasceu com 3,6 quilos e
passa bem.
"Me sinto frustrada, muito chateada. Na hora que eu já estava de 5 em 5
minutos com contrações, chegou a polícia, chegou o oficial de Justiça,
com viatura e ambulância, me aterrorizando, dizendo que, se não eu não
cumprisse o mandado, meu marido ia ser preso", diz a mulher no vídeo,
com Yuja nos braços.
De acordo com o depoimento da mulher, ela teria informado às
enfermeiras que foi ao hospital apenas para ser examinada, mas que não
tinha intenção de realizar o parto lá. O hospital, no entanto, diz em
nota que a médica responsável pelo atendimento constatou a necessidade
de uma cesariana imediata para preservar a vida da mãe e do bebê.
Decidida pelo parto normal, Adelir assinou um termo de responsabilidade e
voltou para casa.
"Ela [a médica] ficou muito mais brava, disse que eu tinha que assinar
[um documento] como se eu estivesse fugindo daqui, que não era ela me
liberando. Aceitei assinar, mesmo como fugitiva, porque o acordo que eu
tinha feito com as enfermeiras era que eu vinha aqui só para ser
avaliada. Já queriam me segurar para o parto cesárea. Assinei o papel
para poder sair daqui e tentar entrar em trabalho de parto em casa",
explica Adelir.
Após ser procurado pela equipe do hospital, e de posse de laudos
médicos que atestavam o suposto risco de morte para a mãe e o bebê, o
promotor Octavio Noronha, do Ministério Público de Torres, decidiu
ingressar na Justiça com um pedido de medida protetiva. A juíza
plantonista Liniane Maria Mog da Silva aceitou os argumentos e
determinou que a gestante fosse levada novamente ao hospital – com o
apoio da polícia, caso necessário – e que o parto fosse feito por
cesariana, se essa fosse a recomendação médica naquele momento.
"Não se buscou, com essa medida, a discussão se é melhor o parto normal
ou a cesariana. O que há nesse caso extremo é o risco de vida da
criança. Para resguardar esse direito à vida, que deve ser tutelado
mesmo contra a vontade da mãe, é que se buscou o ajuizamento da ação",
justifica Noronha. "Acima de todas as preferências, está o direito à
vida da criança. Esse direito deve ser resguardado com absoluta
prioridade. É o que diz a Constituição", acrescenta o promotor.
O diretor-técnico do Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, Marcelo
Fagundes, nega que a instituição tenha induzido a cesariana na paciente e
que, pelo contrário, ajudou tanto a mãe quanto o bebê. Porém, o marido
de Adelir, Emerson Guimarães Lovari, disse que vai processar o hospital e
a equipe médica.
"Eu queria estar mais feliz pelo fato de a minha filha estar saudável.
Se fosse trabalho de parto normal, eu já estaria em casa, porque tenho
outra bebê, e o leite teria descido. O leite não desceu até agora,
porque no parto cesárea isso demora mais", afirma Adelir no vídeo.
Mãe e bebê passam bem após cesariana forçada em Torres, no Litoral Norte do RS (Foto: Arquivo pessoal).